Relações raciais e tensões interpretativas no (e sobre) o Brasil

            Os textos Baianos e paulistas: duas “escolas” de relações raciais? e O projeto UNESCO e a agenda das ciências sociais no Brasil dos anos 40 e 50 nos deixam a par de uma grande tensão interpretativa e política que as ciências sociais enfrentaram na tentativa de compreender as relações raciais no Brasil. Tensões essas que estavam sendo informadas, sobretudo, por um panorama internacional de conflitos raciais sérios, como os provocados pelo nazismo, e pelos conflitos raciais nos Estados Unidos e África do Sul, entre outros casos.

            Marcos Maio (1999) lembra que o Projeto UNESCO sobre relações raciais surgiu na tentativa de encontrar soluções para o problema dos conflitos raciais, e a escolha do Brasil se deu a partir de um corrente pressuposto de que aqui as relações raciais eram brandas, ou mesmo sem conflitos entre raças, numa espécie de democracia racial. Pierson e a Escola de Chicago sustentaram uma análise próximo desse entendimento, o que veio a entrar em tensão teórica e ideológica com as perspectivas francesas e com a proposta de Florestan Fernandes.

            Guimarães (1999) lembra da bipolaridade interpretativa entre os estudos sobre relações raciais produzidos no Nordeste (sobretudo Bahia e Recife) e os estudos feitos em São Paulo e na região Sul. Entre ‘baianos’ e ‘paulistas’ se tem uma dualidade e tensão sobre o fato de (I) existir ou não discriminação ou conflito de classes e raças no Brasil, (II) se o próprio conceito de raça é válido, ou se a (III) noção de barreiras de cor e classes seriam mais apropriadas ou não. Guimarães (1999) afirma que todos os pesquisadores envolvidos nesse período, reconhecem, em parte, a existência de descriminação racial, o que haveria de diferente seria o peso de análise diferenciado sobre essa constatação. Guimarães (1999) também não acredita que as diferenças interpretativas tenham se dado por singularidades metodológicas, mas insiste em pensar que as interpretações diferentes entre um Brasil multirracial e de Brasil marcado por um preconceito de cor relacionado à classe e promovido por uma elite branca, seriam, tais diferenças, frutos de posicionamentos analíticos. A primeira interpretação seria aquela sustentada por Pierson e demais anglo-saxões, numa linha individualista e identitária. A segunda, por Florestan Fernandes, numa perspectiva funcionalista-histórica, analisando o caso brasileiro como particular e aceitando flexionar conceitos.

            Marcos Maio (1999) também lembra que esses estudos (sobretudo o Projeto Unesco) foram importantes na promoção e financiamento de pesquisas em ciências sociais no Brasil. Como uma espécie de demonstração da necessidade de compreensão social, tendo em vista demandas políticas e ideológicas, inclusive de nível internacional. Esses projetos citados por Maio (1999) e Guimarães (1999), desse período 40 – 50, mostram quão importante é para a sociedade um conhecimento científico sobre si, ultrapassando o ensaísmo e a poesia, e gerando condições de análises e interpretações ao mesmo tempo concretas, embasadas, mas flexíveis, não fechadas em si mesma.

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 REFERÊNCIAS

 GUIMARÃES, Antonio Sérgio Alfredo. Baianos e paulistas: duas “escolas” de relações raciais? Tempo Social, v. 11, n. 1, p. 75-95. 1999.

MAIO, Marcos Chor. O projeto UNESCO e a agenda das ciências sociais no Brasil dos anos 40 e 50. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 14, n. 41, p. 141-158. 1999.

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COMO CITAR ESTE TEXTO

SANTOS, Harlon Romariz Rabelo. Relações raciais e tensões interpretativas no (e sobre) o Brasil. [S.l]: Blog Observare, 2016. Disponível em: https://observare.slg.br/2016/03/27/relacoes-raciais-e-tensoes-interpretativas-brasil/. Acesso em: dia mês abreviado. ano.

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