Segundo o dicionário Michaelis emancipação “é o ato ou efeito de emancipar ou de se emancipar”. No caso de um menor, de ter emancipação civil-legal em relação aos seus pais; no caso de uma colônia, a emancipação seria política em relação à metrópole. Assim, fica já implícito que a ideia de emancipação seria o ato ou efeito de se emancipar de algo ou coisa externa ao que quer o se estar emancipando, ficando, portanto, válido o questionamento: os seres humanos, diante dessa ideia de ‘emancipação humana’, estariam se emancipando de quê ou de quem?
Além disso temos o fato de que toda a realidade humana é a realidade em si, sem um devir naturalmente embutido. Óbvio que várias e inúmeras são as formas possíveis da realidade humana. O ‘eterno presente’ é uma ilusão que desconhece a história e mesmo a capacidade criadora do homem. Assim, várias formas sociais poderiam existir – e já existiram ao longo da história e geografias – mas a questão é que todas as realidades possíveis serão realidades em si e não existe – apesar das inúmeras tentativas de se encontrar, sobretudo religiosas – um critério exterior a realidade em si que me faça ou permita dizer que a humanidade – como um todo – precisa ser emancipada, para um outro algo nebuloso que se tornado realidade, passa a ser a próxima realidade em si. E se essa realidade já ‘emancipada’ viesse a existir, fica a pergunta: seria o fim da história humana? Seria o fim, a realidade humana já emancipada?
Enfim, além da inconsistência lógica dessa ideia de emancipação ainda há o aspecto da operacionalidade. Assim, fica um outro – talvez mais importante questionamento: como seria possível conduzir um processo de emancipação em escala humana, a saber, mais de sete bilhões de pessoas a estar envolvidas? Como se daria um processo em escala global que unificasse tantos indivíduos diferenciados em prol de algo sem objetividade, sem substância ou mesmo imaginação sedimentada? Esse processo de ‘emancipação humana’ – poderia argumentar alguns – não pode ser conduzido, mas acontece/aconteceria ‘naturalmente’. Então, a implicação seria de que existem determinantes externos às ações humanas que conduzem a história, percepção essa que seria no mínimo ingênua. Emancipações de todas as formas podem existir, mas não numa escala humana. Somente emancipações ao nível individual, grupal, comunitário, entre outros, seriam possíveis e também quando em relação às formas de opressões ou controles concretos, identificáveis, mas nunca em relação a algo abstrato, indefinido, que estivesse afetando a humanidade como um todo, como se fossem extraterrestres oprimindo a humanidade. E pensar em emancipação de si mesmo é incoerência latente. Impossível pensar uma humanidade se emancipando de si mesma!
Então, tanto por uma abordagem mais conceitual, quanto mais operacional, a ideia de ‘emancipação humana’ não passa de conforto psicológico, como a religião pode assim ser. Não podendo haver espaço para esse tipo de ideia nas ciências ou em outras formas de conhecimento minimamente coerentes.